24 abril 2008

miriá(po)des

tenho simpatia pelas centopéias
que aparecem no canto da cozinha
serpenteantes
se escondem por trás dos pés da mesa
os emboás
de dorso amarelo
anunciam um perigo indeterminado
me respeitam
vez ou outra um piolho de cobra
emerge do ralo do chuveiro
perdido em sabe-se-qual encruzilhada
dos caminhos subterrâneos
enquanto os bugs se revezam
em repartição temporal de nicho
tomo mais um gole de cafeína
pensamentos amazônicos
sob o calor do outono olindense
e das muriçocas
que aprendi mosquitos
me disseram pernilongos
e, acolá, chamam carapanã
enquanto me coço
percebo que bob dylan
inside the Mobile
concorre
nas frágeis caixas de som
com os tambores lá de fora
é bom ouvir tambores
para lembrar
que há sempre um tambor
há sempre
muriçocas, emboás, tambores
bob dylan
e encruzilhadas subterrâneas

01 abril 2008

Quem precisa de ficção?

Mataram meu cachorro.

Assaltaram a casa dos meus pais com uma carroça.

Meu irmão enfiou o carro no poste.

Meu amigo também enfiou o carro no poste

e a Unimed só operou um mês depois.

Meu primo caiu da árvore.

Meu professor teve de extrair o estômago.

Minha namorada,

cuja amiga teve o salário roubado no golpe do celular,

perdeu o emprego sem justa causa.

Minha filha presenciou um assalto a mão armada.

Sua mãe perdeu tudo o que tinha.


Comigo está tudo bem...

Mas fique longe de mim.


Morra de inveja, Lars Von Trier